'Cazuza: Boas Novas' mostra tensão e catarse de sua última turnê

Por Thales de Menezes/Folhapress em 13/06/2025 às 09:48

Reprodução/Masao Godot Filho/Folhapress
Reprodução/Masao Godot Filho/Folhapress

Duas décadas depois da cinebiografia “Cazuza: O Tempo Não Para”, com Daniel Oliveira no papel do ídolo do rock nacional que morreu em 1990 após um calvário físico em decorrência da Aids, chega aos cinemas um documentário muito carinhoso e revelador. “Cazuza: Boas Novas”, com sessão neste sábado (14) no festival In-Edit, tem foco em sua última turnê, com episódios que escancaram sua relação com a vida e com o público.

O caráter acolhedor da narrativa pode ser creditado a Nilo Romero, que dirige o filme ao lado de Roberto Moret. Parceiro de Cazuza e George Israel na canção “Brasil”, talvez a crítica social e política mais incisiva na carreira do cantor, Romero organizou a turnê de 1987 que já mostra um homem debilitado pela doença, que ainda encontraria forças para depois gravar seu derradeiro álbum, “Ideologia”.

Romero tocou na banda montada para turnê e foi testemunha ocular da imprevisibilidade de Cazuza diante do público. Dependendo da noite, o show vai de uma celebração amorosa e entusiasmada a verdadeiros confrontos. Às vezes, Cazuza já partia para xingamentos à plateia logo na música de abertura da noite. A edição do material gravado nos palcos é primorosa na reprodução desse clima de tensão contínua.

As performances diante do público são intercaladas com momentos íntimos, em camarins, festas ou simplesmente na intimidade com a família e amigos. Nesses flagrantes, Cazuza mantém o pêndulo comportamental, exibindo brincadeiras descontraídas ou reações irritadas. A alteração de humor, totalmente compreensível diante do agravamento de suas condições físicas, é aditivada com uma entrega desmedida ao trabalho no palco e no estúdio.

Como esse vasto material registrado, as inserções de declarações de amigos e da mãe, Lucinha Araújo, ganham um respaldo visual que encorpa a narrativa e leva tudo muito além de simples entrevistas. O filme oferece o depoimento mais intenso e carinhoso que seu grande parceiro musical, Frejat, já fez na mídia.

Outro convidado do filme que é um bom guia dos caminhos de Cazuza, principalmente nos anos iniciais da carreira, é o cantor Léo Jaime. Convidado para ser o vocalista do Barão Vermelho, foi ele o responsável pela condução de Cazuza ao posto, um lance essencial para a compreensão da fórmula musical da banda.
O filme entrega, em poucos elementos, toda a polêmica midiática que a condição de Cazuza despertou. Os relatos de Lucinha Araújo sobre o início dos tratamentos nos Estados Unidos são colocados lado a lado com reações intempestivas do filho diante de perguntas dos repórteres.

E um grande momento na tela é a reprodução de trechos da entrevista que Marília Gabriela fez com ele para seu programa “Cara a Cara com Gabi”. Diante da pergunta simples e direta, “Você está aidético?”, Cazuza nega ser portador do HIV. Hoje, tanto tempo depois, essa breve declaração ainda consegue impactar quem está assistindo.

A parte final do documentário ganha contornos um pouco mais sombrios. Fala da decepção de Cazuza e Lucinha quando a revista Veja publicou a entrevista da edição na qual ele aparece esquálido na capa. A mãe afirma que o filho ficou tão afetado com a maneira como o texto foi editado, com um caráter sensacionalista, que Cazuza ou mal e precisou ser internado, correndo risco de morte.

Outro lado pesado dessa fase final da vida do cantor está presente nas declarações de Lucinha e do próprio Romero sobre as gravações do último álbum, “Ideologia”. Cazuza chegou a gravar vocais deitado, preservando forças para o ato de cantar. E, durante todo o trabalho, uma ambulância com UTI ficou a postos na porta do estúdio.

O filme terá sessões no festival de documentários musicais In-Edit Brasil, apresentado agora em São Paulo. Depois entra no circuito comercial em 17 de julho, dez dias depois do 35º aniversário de sua morte.

Além de um retrato emotivo do artista, é a chance de relembrar ou conhecer suas músicas, muitas exibidas integralmente no filme. A obra poética e musical de Cazuza é algo muito superior a qualquer tentativa produzida hoje.

Cazuza: Boas Novas

  • Avaliação: Muito bom
  • Quando: Sáb. (14), às 18h, e qui. (19), às 19h30, na Cinemateca; dom. (22), às 16h, no SPCine Olido. Estreia em circuito no dia 17 de julho
  • Onde: No festival In-Edit Brasil
  • Produção: Brasil, 2025
  • Direção: Nilo Romero e Roberto Moret
loading...

Este site usa cookies para personalizar conteúdo e analisar o tráfego do site. Conheça a nossa Política de Cookies.